Desvio de Memória

--

Memória de fragmentos do passado, Leonor Fini, 1984

Os restos do que teria sido: os coágulos as manchas o ardor — as tantas partes de mim

Não sei porque me dói tanto

porque ainda deixo que inflame e me queime

e me arda

meus cílios molhados os olhos de sal a tristeza meus dedos meus olhos e o som leve dos meus pés

depois o silêncio. É sempre o silêncio.

Queria ter a memória ruim e esquecer

[tão simplesmente esquecer]

todos os ditos cruéis desses anos — e meu deus foram tantos

foram tantos que nem sei

por qual deles derramo essa lágrima agora

o que sei é que me ocupo com curativos e chumaços de algodão

e tento tornar a noite um pouco maior

para que o sono me corrija a memória.

--

--