Escombros
eu sonhei esse poema e adormeci
--
Há o sentido dos escombros e nada além daqui:
a linha sob minha clavícula e
essa sombra sob meus olhos e
esse prateado entre certas linhas de meus cabelos
{ignoro o íntimo vislumbre dessas mãos.
observo meus ombros sob a claridade tão clandestina e a pele nua que [silenciosamente reconheço]: é minha pele nessa curva dos meus ombros.
escondo o inaceitável resistir — romper com a ponta dos dedos.
recomeço: a linha sob minha clavícula
o osso alumiado sob minha pele
sob minha carne fibras linhas tanto corpo
e a linha sob minha pele.
tudo embaixo}
tudo sob}
já não há nada além dos escombros e ainda assim pergunto:
— sob minhas linhas cabelos fios e partículas invisíveis de unhas (sob o esbranquiçado de minhas unhas), quem se importa?
não há nada além dos escombros
a voz da cigana repudiada é que repete:
— sob tuas carnes e teus ossos tuas linhas teu sigilo contante de existir
não me conformo e peço ainda outra voz
mas a feiticeira esquecida geme e nada diz — e não há nada além de escombros
repete seu olho e vejo pela linha d’água que esse olho também é meu
que a voz da cigana e da feiticeira é a minha
que as mãos sob os vestidos os dedos sob os lençóis e a pele sob o clarão os ossos sob o tecido: tudo meu e eu.
então observo: é ele — o íntimo silêncio dos escombros
o clarão distante que me há de salvar.