por do sol, de Camille Pissarro, 1872

Guardanapo

Rute Ferreira
2 min readDec 5, 2024

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Procuro nos telhados vermelhos

nos jardins esquecidos atrás de uma plataforma de concreto

nas edificações mortas e nos terrenos baldios

uma insígnia que carregue teu olho, meu amor,

escondido como arma ritual.

Há tanto tempo que não ouço tua voz e se me escondo é procurando o timbre exato que me fez entender

certa vez

que as palavras tem textura e gosto — sendo teu nome salgado e tua saudade áspera.

Também áspero o caminho quando não te vejo — umas tantas voltas sem abrigo.

E procuro nas portas abertas

nas escadas carentes de pedras nas sobras de uma camisa rota

nos vidros rachados de uma janela

um emblema ilustrado com tuas mãos que eu possa costurar em minhas roupas como quando carregava nos antebraços

o cheiro que vem de ti.

Adormeço entre os lençóis claros e desperto quando escurece procurando saber do teu rosto

que há pouco se colava em minha pele como emplastro

e repentinamente

me curava.

Por isso é que procuro ainda entre as bolsas de pano e os chinelos de dedo

entre as canetas

por dentro de cada livro [sobretudo em cada livro

que exista um recado teu: uma mensagem cifrada escrita anos e anos antes do nosso nascimento mas que seja uma divisa

do tamanho do nosso amor.

Irmanados, teu olho e o meu poderiam inaugurar uma espécie de novo país

uma linhagem desconhecida de um mundo desabitado

cercado por gerânios, buganvílias, rosas e girassóis

todas as ervas crescidas nas rachaduras

nos mínimos espaços que há entre os telhados vermelhos, meu amor,

e o teu coração.

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